06/10/16

Discurso de Vergílio Alberto Vieira no almoço em Braga do 82º PEN International

No dia 30 de setembro, passaram por Braga cerca de 140 participantes (escritores, dramaturgos, jornalistas, poetas, etc.) do 82º Congresso PEN International, que se realizou na cidade galega de Ourense.
Durante o almoço o escritor, poeta, dramaturgo e Amigo da Companhia de Teatro de Braga, Vergílio Alberto Vieira, brindou os convivas com este belíssimo texto que merece ser partilhado.


Com a presença de tão ilustres escritores numa das mais antigas cidades ibéricas a que chegaram legiões romanas, séculos depois de visitada por Celtas e Suevos, que escolheram para morar, Braga tem hoje boas razões para vos proporcionar, não apenas a visita aos lugares históricos que enaltecem o seu património cultural e urbano, mas a convivência coma a lingua portuguesa, legado inestimável do cosmopolitismo que caracterizou a epopeia marítima cantada em Os Lusíadas, de Camões.

A Língua que falámos, e em que escrevemos, sendo o nosso maior bem, e a pedra de toque de uma universalidade que ecoa em todos os continentes, é como das línguas maternas reconheceu Alfred
Döblin, escritor que, acossado pelo nazismo, passou por Portugal a caminho da diáspora: "(..) uma forma de amar os outros."

Num tempo em que os sinais de degradação histórica intimam o escritor a estar vigilante, e a ser testemunha irrefutável no processo para que o tribunal das memórias nos convoca, nenhum de nós poderá sentir-se bem consigo, nem com o mundo, se por comodidade ou indiferença não responder à chamada para a qual a resistência ética de que falava Emmanuel Levinas conta connosco.

Assim sendo, permitam-me exortar-vos à conciliação num momento em que a história das nações mais se sente ameaçada, num tempo em que cada pátria em que nascemos nos leva a admitir que todos os povos estão à beira de morrer como país.

Nessa ordem de ideias, se ao tempo de Monsenhor Della Casa "a experiência do escritor era considerada "um estado de guerra", não o será, pois, menos actualmente, não o foi menos ontem, quando alguém gritava em Alepo: "O silêncio do mundo está a matar.-nos."

Termino apelando a todos os presentes que é chegado o tempo de: dizer não o que é preciso, mas que é preciso; que todas as vidas, como lembrou clarice Lispector, são "vidas heróicas"; e todos os povos aquilo que são as suas memórias, a sua memória profunda.

Contando com a vossa benevolência, evoco Camões, o poeta que exaltou o povo que se aventurou a dar novos mundos ao mundo para - diria ele: na vossa lustrosa e grata companhia - considerar que:

"Já deve bastar o que aqui digo para dar a entender o que mais calo."

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